terça-feira, 10 de janeiro de 2012

“Novas Vovós”, matéria que saiu na Revista da Folha, de SP

Dia desses estava no face e vi um link postado pelo Superziper que levava para essa matéria bem legal, que foi publicada em São Paulo. Trouxe para cá para compartilhar com vocês... 

August 22, 2011
A matéria está tão legal que vou apenas reproduzi-la aqui.
Saem os cabelos brancos, a cadeira de balanço, as lãs em cores pastéis. Entram os blogs, os fios metálicos e as moças entre 25 e 40 anos com cabelos e roupas da moda. São essas as diferenças que permitem dizer que há, na cidade, uma nova geração de tricoteiras, que nos últimos anos despertou a atenção de fabricantes e vendedores.
Intríseca à imagem clássica da avó, a atividade tem atraído jovens mulheres por três principais motivos. Umas defendem o resgate de trabalhos manuais em geral, o que também inclui cozinhar e jardinar –atos considerados terapêuticos. Outras encontram motivação na moda. Desfilar por aí com peças exclusivas, feitas sob medida, é uma compensação que, dizem, vale as horas dedicadas às agulhas.
E há as que encaram o tricotar como uma transgressão contra o consumismo desenfreado, o que lembra o movimento DIY (“do it yourself”, ou “faça você mesmo”), encampado pelos punks nos anos 1970 e 80. A publicitária Andrea Onishi, 36, faz parte do primeiro grupo. Com vontade desde criança de aprender a tricotar, ela foi atrás de livros, tutoriais (passo a passo) e vídeos na internet. Aprendeu tanto que virou referência.
Há seis anos, Andrea montou o blog Superziper, voltado para manualidades, com destaque para o tricô. Atualmente, a página é acessada por cerca de 4.000 pessoas todos os dias. A internet, para essa nova turma de tricoteiras, é um acessório tão fundamental quanto agulhas e lãs.
SÓ EU TENHO
Para que suas bonecas tivessem roupas exclusivas, Cristiane Bertulucci, 27, foi tricotar com a avó paterna quando tinha nove anos. Hoje, é estilista e professora. “O tricô, para mim, tem a ver com aversão ao massificado e com buscar algo diferente para vestir e que tenha algum valor sentimental”, diz ela, que dá aulas particulares, para grupos e até para crianças.
Cristiane também é uma das fundadoras do coletivo Tricotarde, que reúne jovens apaixonadas por novelos e promove intervenções urbanas, como envolver árvores com peças feitas de lã. “Vestimos uma das árvores do parque Trianon [na av. Paulista], mas não durou muito. Logo mandaram tirar nosso trabalho de lá.”
Espalhar o tricô pela cidade é uma das diferenças em relação às tricoteiras tradicionais. A nova geração também usa cores e pontos distintos. No grupo de 15 senhoras liderado pela professora Sonia Biondi, 72, os tons pastéis são os preferidos. As veteranas, que se reúnem semanalmente, gostam de “rosinha”, “verdinho”, “azulzinho”, tons que combinam com roupas para bebês, as peças mais confeccionadas por elas. Também fazem sucesso pontos mais elaborados, como tranças, e flores de crochê, para enfeitar boleros e cachecóis.
Entre as mais novas, as cores são mais escuras e quentes e as lãs, mais grossas. “As tricoteiras modernas preferem pontos largos porque ficam prontos mais rapidamente. Em uma tarde você consegue começar e terminar um trabalho”, diz Cristiane.
NOVOS RUMOS
O mercado de lãs já percebeu que algo está mudando. Fios mais grossos, com efeitos especiais e cores da estação estrearam nas prateleiras nos últimos invernos. “Elas [as mais jovens] começam a influenciar os hábitos das veteranas”, explica Juliana Bueno, gestora de marketing da Pingouim, uma das maiores fabricantes de lãs do país. “Uma das nossas linhas mais tradicionais, a Flash, acaba de ganhar uma nova tabela de cores por conta dessa mudança de comportamento.”
Outra marca, a Aslan Trends, também está de olho. Segundo Marina Pontieri, do time de estilo da empresa, esse novo perfil ganha força e tem a internet como principal fonte de divulgação da mania entre as modernas. Para agradá-las, a marca lançou neste ano uma lã com brilho metálico. Também neste inverno, a Vila Madalena, na zona oeste, ganhou seu primeiro café dedicado ao tricô. Na Novelaria Knit, inspirada em espaços europeus e americanos, onde o tricô é febre entre os jovens há alguns anos, é possível beber vinho, tomar sopas e comprar lãs importadas da Argentina.
“Há um ano, eu e minha sócia idealizamos um lugar de convivência, de troca, parecido com alguns que visitamos na Califórnia”, conta a empresária Lica Isak. “A ideia é ir além do armarinho do bairro e oferecer um programa mais completo.” De segunda a sábado, são ministrados ali quatro tipos de aula em 18 horários diferentes. Além de trabalhar as mãos, o tricô também ocupa a mente. Foi assim para a designer gráfica Luciane Kras. Quando se mudou para Nova York, há cinco anos, por causa do trabalho do marido, ela decidiu que era hora de buscar mais qualidade de vida. Resolveu, então, frequentar as aulas de tricô do Fashion Institute of Technology.
“Vinha de uma rotina insana de trabalho e esse período de pausa foi importante para eu ver o que realmente queria”, diz ela, que fez o curso durante três meses. De volta a São Paulo, o tricô virou vício. Ela carrega o kit para todos os lugares e pratica enquanto conversa com os amigos. Já produziu casacos, vestidos e golas gigantes para o próprio guarda-roupa e sempre recebe encomenda de amigas. Costuma trocar truques de pontos usando fotos feitas com o iPhone.
Outro benefício mental citado pelas jovens tricoteiras é aprender a lidar com as imperfeições. “Você percebe o erro em um ponto, mas sabe que sempre pode desmanchar e começar tudo de novo. Ou, então, ignorar e aceitar que aquilo faz parte do trabalho”, diz a produtora cultural Melina Valente, 37. “Ter um projeto de tricô ou crochê nas mãos significa estar produzindo algo. Isso é muito poderoso”, afirma ela, que frequenta os encontros do grupo Tricotarde, que ocorrem um sábado por mês no espaço Cartel 011, em Pinheiros, na zona oeste, cuja programação mistura arte, música e moda.
Tricotar, bordar ou fazer crochê é também uma maneira de manter vivo um conhecimento que corre o risco de se perder no tempo. Foi com essa intenção que as amigas Flávia Lhacer, 27, e Vanessa Rozan, 31, criaram o Clube do Útero. Ainda restrito a uma página na internet (www.clubedoutero.blog
spot.com), o movimento quer oferecer workshops de trabalhos manuais. Suas fundadoras planejam a abertura de um espaço para os encontros, provavelmente no Baixo Augusta.
Para aumentar a prática, Flávia, que é figurinista, passa uma tarde por semana na casa da avó, Claudia, 84, bordando. “Foi ela que me ensinou os primeiros pontos.” Vanessa, maquiadora, é neta de costureira, mas só se interessou pelo bordado depois de conhecer o livro “Subversive Cross Stitch” (ponto de cruz subversivo). “Achei o máximo ver as receitas com frases e figuras muito diferentes do ponto de cruz tradicional”, lembra ela, que se reúne com as amigas e, entre uma taça de vinho e outra, troca dicas.
Como nas jovens tricoteiras o contraste visual entre moderno e antigo é evidente, não raro ele atrai chacotas. Andrea, do blog Superziper, estava tricotando com uma amiga no calçadão de Santos quando ouviu de um ambulante: “Estão treinando para serem avós?”. A professora Cristiane já escutou: “Nossa! Tão bonita e tricotando…”. Pelo jeito, vai ser difícil combinar tricô e modernidade. E talvez seja exatamente essa a ideia.

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